Sobre

As Pessoas com Autismo

As pessoas com Autismo têm um conjunto de características que as acompanharão ao longo da vida e que se refletem no modo como comunicam e se relacionam com os outros mas também no modo como se relacionam com o mundo à sua volta.

São habitualmente pouco flexíveis, resistindo á mudança e tendo dificuldade em lidar com novas situações. Têm sensibilidade sensorial alterada, dificuldades de processamento sensorial e dificuldades de regulação emocional.

A forma como o autismo se manifesta é diferente nas diversas fases do ciclo de vida (infância, adolescência, idade adulta), depende da resposta às intervenções realizadas e da presença de situações de comorbilidade, nomeadamente a associação com défices intelectuais. O termo Espectro do Autismo pretende dar conta da enorme variabilidade das pessoas com autismo.

As pessoas com autismo não constituem um estereótipo e podem revelar-se muito diferentes umas das outras. Cada pessoa com Autismo tem a sua própria personalidade, sendo um indivíduo único.

O que é o Autismo?

O Autismo é uma condição do neurodesenvovimento, caracterizada pela presença simultânea de dificuldades ao nível da relação com os outros, da comunicação verbal e não verbal, padrões restritos e repetitivos de comportamentos e interesses, com frequentes alterações na reatividade e integração sensorial.

A DSM-V, 2013 (Manual de Diagnóstico de Perturbações Mentais da Associação de Psiquiatria Americana) inclui as Perturbações do Espectro do Autismo (PEA) dentro das Perturbações do Neurodesenvolvimento. Define três níveis crescentes de Gravidade, nível 1, nível 2 e nível 3 e não reconhece a existência de subdiagnósticos nomeadamente Perturbação de Asperger, Perturbação Desintegrativa da Infância e Perturbação Global de Desenvolvimento Sem Outra Especificação. Exclui das PEA a Perturbação de Rett.

As principais características para o diagnóstico de PEA são o défice persistente na comunicação social reciproca e na interação social (critério A) e os padrões restritos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades (critério B). Os sintomas estão presentes desde a infância e limitam ou comprometem o funcionamento do dia a dia (critérios C e D). As manifestações da perturbação variam em função da gravidade da condição autística, da idade de desenvolvimento e da idade cronológica.

Critérios de Diagnóstico

A) Défices persistentes na comunicação e na interação social que são evidentes em múltiplos contextos:

  1. Défices na interação social que se manifestam como dificuldade em iniciar uma interação social, dificuldade em manter-se adequadamente em interação com o outro e a estabelecer um diálogo; dificuldade em partilhar interesses, emoções e afetos.
  2. Défices na comunicação verbal e não verbal usada na interação social que se manifestam por dificuldades mais ou menos intensas no contacto ocular, no uso e na compreensão dos gestos e das expressões emocionais faciais (ex.: tristeza, alegria, medo, zanga, entre outros).
  3. Défices em desenvolver, compreender e manter relacionamentos com os outros. Dificuldade em ajustar os comportamentos aos diferentes contextos sociais. Dificuldade em fazer amigos, desinteresse pelos pares.

B) Padrões restritos e repetitivos de comportamento. Interesses ou atividades que se manifestam como pelo menos 2 dos seguintes:

  1. Movimentos, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos ex.: esteriotipias motoras como batimentos de mãos ou movimentos repetitivos dos dedos, alinhamento de objetos ou brinquedos, ecolália ou uso de frases estereotipadas e repetitivas.
  2. Resistência á mudança, adesão inflexível a rotinas ou padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal (angustia extrema face a pequenas mudanças, rigidez de pensamento, necessidade de fazer sempre o mesmo percurso casa escola ou de comer a mesma comida todos os dias, entre outras).
  3. Interesses extremamente restritos e fixos que são anormais quer em intensidade quer em foco (ex.: ligação forte e preocupação com objetos incomuns).
  4. Hiper ou Hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesses incomuns por aspetos sensoriais do ambiente (ex: indiferença à dor/temperatura, respostas adversas a sons ou texturas específicas, tocar ou cheirar objetos excessivamente, fascínio visual com luzes ou movimentos)

C) Os sintomas têm que se manifestar durante o período de desenvolvimento (mas podem não ser evidentes até as exigências sociais excederem as capacidades do sujeito ou serem mascaradas por estratégias aprendidas)

D) Os sintomas causam prejuízo significativo no funcionamento social, ocupacional ou outras áreas importantes do funcionamento atual.

E) As perturbações não são melhor explicadas por incapacidade intelectual ou atraso global do desenvolvimento. O défice intelectual e o autismo co-ocorrem frequentemente mas as dificuldades de comunicação e de relação devem estar abaixo do esperado para o nível intelectual do sujeito.

O Autismo manifesta-se precocemente, sendo possível, na maior parte dos casos, estabelecer um diagnóstico entre os 18 e os 36 meses. Um diagnóstico precoce e uma intervenção adequada é fundamental para que se consiga um desenvolvimento mais harmonioso das crianças com autismo.

Algumas crianças apresentam um quadro clínico típico, tal como foi inicialmente descrito por L. Kanner (1942), as outras caem dentro de um continuum de situações a que L. Wing chamou de espectro autista. O Autismo é mais frequente no sexo masculino embora se admita que seja mais difícil de diagnosticar nas mulheres.

Etiologia

Não foram identificados marcadores biológicos específicos nem existirá uma causa única para o autismo. O peso dos fatores genéticos é reconhecido e admite-se uma etiologiamultigénica e multifatorial e a variabilidade clinica pode corresponder à interação de múltiplos fatores causais entre si.

Admite-se que a privação de experiências de interação social/relacional precoces reforçam e/ou determinam um desenvolvimento desviante dos circuitos e conectividade cerebral, sabendo-se que a experiência e a eventual privação social/relacional vai também modular o neurodesenvolvimento cerebral

Prevalência

Os estudos epidemiológicos realizados nos últimos anos apontam para prevalências próximas do 1% tanto nas crianças como nos adultos.

É mais frequente no sexo masculino do que feminino, numa razão de 4:1 embora se admita que nas mulheres é mais difícil de diagnosticar.

Em Portugal, o único estudo realizado (Guiomar Oliveira 2007) aponta para uma prevalência de 1 para 1000.

Sinais de Alarme

Um diagnóstico seguro de Autismo é geralmente feito pelos 3 anos de idade. Aos 18 meses é já possível detetar nestas crianças um conjunto de características, cuja presença é um indicador bastante seguro de autismo.

Sinais de Alerta

A pesquisar na avaliação da criança aos 18 meses:

Sinais Inespecíficos mas Preocupantes

Até aos 18 meses (podem estar presentes desde o nascimento):

Manifestações mais Comuns

1. Isolamento

Crianças com Perturbações do Espectro do Autismo manifestam um aparente alheamento relativamente ao meio, não mostrando interesse no contacto com outras pessoas.

Não interage com outras crianças ou adultos, mas quando interagem fazem-no de forma inadequada.

2. Ausência e/ou Alterações ao Nível da Linguagem

Cerca de 50% das pessoas com autismo não desenvolvem a linguagem (às vezes este é o primeiro sinal de alarme para os pais).

Os que têm linguagem apresentam alterações significativas, nomeadamente dificuldade ou incapacidade de usar a linguagem na comunicação com o outro. Dificuldade ou incapacidade de falar na primeira pessoa (não dizem o “eu”, referem-se a si próprios na segunda ou terceira pessoa). Respondem repetindo a pergunta ou parte dela (ecolalia). Alterações no tom e ritmo do discurso. Dificuldades na compreensão da linguagem, interpretação no sentido literal, dificuldade em “apanhar o segundo sentido”. Por exemplo, um comentário do tipo “o ar hoje está pesado” é entendido no sentido literal, ou seja a criança entendeu que o ar pesa (quilogramas).

3. Evitamento do Contacto Visual

Normalmente não estabelece contacto visual direto (olhos nos olhos) com as pessoas e/ou atividades do momento (por exemplo, quando pintam não olham para o papel), dependendo mais do olhar periférico “pelo canto do olho”. Por vezes olham o outro mas aparentemente sem o ver (como se fosse transparente).

4. Desinteresse pelas Pessoas e/ou Jogos (Brincar)

Crianças com autismo não têm capacidade espontânea para iniciar um jogo com significado que envolva a imaginação – jogo simbólico, faz de conta. Tendem a envolver-se em atividades repetitivas não interagindo com as outras crianças ou adultos. Por exemplo, preferem atirar uma bola contra a parede do que para outra pessoa. Preferem brincar sozinhas.

5. Medos Pouco Usuais

Crianças com autismo respondem aos estímulos sensoriais (visão, olfato, tato, paladar e audição) de maneira pouco previsível. Por exemplo, estímulos visuais com cores brilhantes podem fascinar algumas e provocar ansiedade ou medo irracional noutras. Estas crianças têm dificuldade em regular os estímulos sensoriais.

6. Uso Inadequado de Objetos

Crianças com autismo parecem fascinadas por partes de brinquedos, como as rodas de um carro, não mostrando interesse pelo brinquedo em si.

Com frequência desenvolvem uma ligação obsessiva com determinados objectos, podendo a perda destes causar um estado de grandes ansiedade e excitação.

7. Resistência a Aprendizagem

Crianças com autismo têm grandes défices na área da comunicação, isto é dificuldades em compreender tanto as instruções verbais como não verbais (gestos, mímica, expressões faciais, entre outros).

Parecem mostrar pouco interesse e rejeitar as tentativas de aprendizagem, especialmente quando não há uma recompensa imediata.

8. Girar Obsessivamente Objetos

Objetos redondos e suscetíveis de poderem rodar produzem uma enorme atracão. Por exemplo, colocam um carro de pernas para o ar e fazem rodar incessantemente as rodas.

9. Riso ou Choro sem Motivo Aparente

Crianças com autismo podem rir, chorar ou gritar em situações inapropriadas e sem motivo aparente. Por exemplo, riem-se quando alguém grita ou ficam com medo quando alguém ri. Em algumas crianças estas atitudes desajustadas prolongam-se criando situações de grande ansiedade, tanto para elas como para os pais.

10. Ausência da Consciência do Perigo

Ausência de receio de perigos reais e medo irracional de situações comuns. Isto poderá ser consequência da falta de compreensão das situações ou seja, não estabelecem a correlação entre causa e efeito

11. Inconsistência nas Respostas aos Sons

Crianças com autismo podem ignorar sons altos e reagir a um murmúrio ou ao roçar das folhas de papel.

Em muitas circunstâncias poderá parecer que têm problemas de audição (surge então a hipótese da surdez).

12. Ligação Obsessiva a Objetos

Muitas crianças com autismo estabelecem ligações bizarras a certos objetos ou a partes de objetos, como pedras, peças de brinquedos, etc. Poderão ficar fascinados por objetos que produzam som (como copos, campainhas, entre outros).

Os objetos são muitas vezes selecionados por uma característica particular (cor, textura e forma) e são transportados para toda a parte. Ficam tensas ou mesmo em pânico se alguém pretende tirar-lhos.

13. Rejeição do Contacto Físico

Muitas crianças com autismo podem resistir ou mostrar desagrado a serem pegadas ou tocadas. Não é raro os pais dizerem “ele estava tão feliz quando estava sozinho, mas começou a gritar e a chorar quando o peguei ao colo”. Muitas crianças não exibem movimentos de antecipação para serem pegadas ao colo, adotando a “postura de boneco”. Com frequência, mesmo em situações geradoras de stress, não procuram o necessário conforto, ajuda ou segurança junto de adultos ou de outras crianças. A sua capacidade em mostrar empatia é limitada, traduz-se numa perturbação da interação social e dificuldades no estabelecimento de relações de amizade.

14. Resistência à Mudança

Com muita frequência estas crianças aderem de forma inflexível a determinadas rotinas, geralmente não funcionais. Por exemplo, quando vão para a escola têm de ir sempre pelo mesmo caminho e para se vestirem têm de seguir uma determinada sequência.

Há uma intolerância às mudanças de ambiente (pequenas mudanças verificadas no quarto poderão produzir uma grande irritabilidade).

As crianças com autismo sentem-se mais seguras e confortáveis em ambientes estruturados e previsíveis. Qualquer alteração ou desvio à rotina não planeada podem causar ansiedade e conduzir a comportamentos bizarros ou a um estado de extremo stress.

15. Comportamentos e Atividades Repetitivas e Estereotipadas

Tendência a manterem-se em atividades repetitivas, estereotipadas e rotineiras. Podem tratar-se de rotinas simples ou extremamente complexas. Por exemplo, bater em superfícies, balancear, cheirar pessoas e coisas, abanar os braços, torcer os dedos, com os braços fletidos fazer batimentos repetitivos das mãos, colecionar os mais diversos objetos/partes de objetos/lixos, alinhar objetos, entre outros.